terça-feira, junho 30, 2009

O que falta?

Fernando Schweitzer, Buenos Aires/ARG - Ator Não-Global, Diretor Teatral, Cantor, Escritor e Jornalista



Exatamente! Metade do ano. Momento de fazer um balancete da vida o ao menos dos muitos acontecimentos recentes. Onde? No mundo? Claro. No meu mundo... É um dos que mais conheço, apesar de que dizem que a grama do vizinho sempre é mais verde. Creio que se pode também ao invés desta frase, se dizer que é a do vizinho a grama mais fácil de criticar. Devo confessar um grande erro que cometi em minha vida, ou seriam vários? Milhares, que nem da metade recordo. Alguns que recordo sem parcimônia lhes digo. Deveria ter amado mais, pois que digam que isso é cafona ou ultrapassado. Deveria ter chorado mais, já estou quase plagiando uma canção. Agora já foi... Ter feito tudo que eu queria fazer.

A quem possa crer interessar ou não, creio que minha vivência ressente em um outro país possa interessar a alguém. Se não, escrevo igual. Mas para isso ter um pouco de nexo devo informar ao quem ainda não o está, quem seria esta criatura errante que lhes escreve. Ou que a eu mesmo me reporto em um sentimento autóctono e auto antropofágico.

Nascido em berço simples, e vejam que não disse pobre pois seria muito piegas, em São Paulo, localidade de Suzano. A início da década de 80, final de ditadura no longínquo país, quase colônia americanizada situada ao sul do hemisfério sul. Passante por vários estados deste, sofrido vivente não aculturado em sua juventude na longínqua Santa Catarina, vivi meus últimos dias na República das Bananas em sua "capital" Florianópolis. Hoje erradicado em Buenos Aires com dois grandes pesares: Ser brasileiro y infelizmente ainda não naturalizado portenho.

Qual sofrimento desta situação? Primeiro ter de largar um país nativo por não conseguir muda-lo. Como em uma ditadura aberta, a dita-branca hoje vigente no "brasil", obriga aos não negligentes para com ele ou que se tornem podres e imbecis ou que fujam do país. A nossa mídia tem sido um grande aliado histórico e atual desta continuidade ideológico-sócio-normativa. Diriam os defensores do indefensável país mais cercanos a consciência: Mas você vai desistir do país pelo qual você já tanto lutou? A resposta é pior que a pergunta para estes mesmos. Digo eu em resposta: "Não sou eu que desisti do país, o país que desistiu de mim!".

A medida que eu não consegui me tornar podre e conivente a barbáries sócio culturais de vários graus aceitas sócio-culturalmente no país, e todavia este tão pouco quis deixar de valorizar as mais torpes criaturas existentes no universo e no próprio país... Restou-me apenas fugir ou deixar-me definhar pelo sofrimento, a exclusão sócio-cultural e a dor de ver os seres mais decrépitos e corruptos vencendo e sendo valorizados.

Ao chegar na Argentina lhes digo caro leitor, as dificuldades foram além do idioma todas. Você sair de um país onde o maior produto de exportação são coisas vulgares te atrapalham ou ao menos aos mais corretos e decentes entristecem e incomodam. A cada vez que obrigatoriamente você tiver que cometer o fatídico erro de proferir em voz alta sua nacionalidade, por favor jamais diga que é brasileiro. A não ser que queira responder as malditas perguntas que se repetirão inúmeras vezes pós este ato impensado:

- ¿Sos de Brasil? ¿Te gusta axé?
- ¿Sos de Brasil? ¡Juegas futbol! A todos los brasileños le gusta futbol, ¿no?
- ¿Sos de Brasil? ¿Juegas capoeira?
- ¿Sos de Brasil? ¿Sabes sambar?
- ¿Sos de Brasil? Las mujeres de "brasil" son hermosas...
- ¿Sos de Brasil? Me encanta "brasil", ¡todos son tan alegres!

Entre estas várias perguntas me me enfurecem a alma e corroem meu ser pela infelicidade de ter nascido no "brasil", existem muitas outras similares que tanto ou mais me irritam. Essa desgraçada imagem idealizada do país vizinho que têm os argentinos e todo o mundo é com certeza culpa dos governos que nada fazem pelo país e seu coniventes que respaldam essa pseudo democracia, menos democrática que Cuba, ou qualquer ditadura medieval ou contemporânea.

Segundo vários autores, cito: Marx, Weber, Adorno, Durkheim, Bordié, Bodeler, Ramoné e Luis Melodia, existe um consenso de práxis de que um ser apenas é livre quando é consciente. E antes que os psicóticos, psicólogos, psiquiatras ou pseudo seres humanos nos perguntem o que é consciência eu lhes digo que é o que não é inconsciente, automático, sociopaticamente aceito sem crítica por status quo. E peco que ninguém que recompile este texto ponha o termo status quo em parênteses ou qualquer outro tipo de grafismo que o diferencie do restante deste texto. É quase uma vontade testamental, a qual não se deve desrespeitar.

Esperando que não haja consciência de uma minoria para que não hajam novos excluídos funcionais, fugitivos culturais, emigrantes do império e da sociedade vendida e vendedora sem valores daquele que poderia se não o fosse como é ser uma grande nação. Ou que uma ampla maioria não se se conscientize, seguindo a matiz marxista revolucionária de cambio social, onde pensasse que somente um povo consciente de seu papel no mundo e de sua realidade podem ter chance de modificar o status quo de sua triste realidade de exclusão.

O que mais me perguntam, perguntaram e perguntarão a meu esquálido e desvalorizado ser? Se você não adivinhou ainda, realmente não sei se deves continuar a ler este punhado de letras que aqui estão. A resposta vem antes quiçá assim venha as mentes a desvairada e talvez hoje diria inocente pergunta. Proferia eu que "buscara um país, com uma maior noção de nação e um pouco mais de valorização a cultura e ao amor próprio". Fácil agora não? Para quem ainda não, a pergunta do milhão é: Argentina? O que você vai fazer na Argentina?

Bem, a resposta antes de minha vinda a este país desconhecido de seus vizinhos brasileiros está acima. Ou melhor a que eu tinha para o momento. Agora, depois de 6 meses e 26 dias residindo em Buenos Aires tenho outras.

Poderia ser sincrético e citar Gardel, ícone da música argentina, e assim apenas por status quo não precisar argumentar:

Mi Buenos Aires, tierra florida donde mi vida terminaré.
Bajo tu amparo no hay desengaños, vuelan los años, se olvida el dolor.

Apesar do respeito que tenho pelo senhor Carlos Gardel devo descordar. Pois, infelizmente, a dor não se esquece, as vezes se deixa de sentir por um ou vários momentos. E não sei se aqui minha vida terminarei, devido a falta de cumprimento de acordos bilaterais mal feitos, não posso fazer documentos argentinos e me legalizar plenamente no país. Como o maior país do mundo tem critérios distintos dos demais países de seu bloco, o famigerado Mercosul, precisei voltar ao "brasil" três vezes para refazer documentos não considerados aqui.

O melhor de tudo é que 4 meses antes de mudar do país fui a chancelaria do ministério de relaciones exteriores em Florianópolis e recebi as instruções de como proceder para concluir estudos no exterior. Detalhe todos os indicativos errados, ademais ao buscar o consulado e embaixadas brasileiras fui instruído a me dirigir a Brasília para fazer as validações de documentos, que pasmem somente são feitas na capital federal em um setor do ministério de relações exteriores que funciona apenas de 9h as 11h. E ainda fui obrigado a escutar do atendente a seguinte frase: "Você quer o trâmite para hoje?".

Voltando ao norte do prólogo... Descobri dentre muitas coisas nestes 6 meses. Descobri que o espanhol a la mexicana que aprendi torpemente é plenamente diferente do argentino e mais ainda do portenho, ou seja, da capital. Descobri que portenhos são só os da capital e não qualquer argentino. Dentre entre várias coisas que aqui existe cerveja de 1 litro a R$ 1,80 no mercado, que se pode falar de obras de teatro alternativo em programas de TV comerciais, que o Metrô(Aqui chamado de Subte) pode custar R$ 0,75 e ainda assim quando subir pra R$ 0,78 o povo reclamar e até fechar ruas em protesto, que os argentinos conhecem mais do "brasil" que os brasileiros possam pensar, que os brasileiros sabem mais do longínquo e imperialista império do norte que do país vizinho, que um país católico e que por seus nativos é denominado conservador, tem a união civil entre pessoas do mesmo sexo aprovada desde 2003 (primeiro país das Américas a ter lei de tal âmbito), enquanto o grande vizinho encuba seu projeto similar de autoria de Marta Suplicy desde 1994, etc...

Se já disseram que o Uruguay já fora a suíça das Américas por ter-se tornado um paraíso fiscal, deve se dizer que Argentina é o novo ponta de lança da modernidade no continente excluído. Isso que o PIB do país numericamente seja apenas o 4° das Américas.

Havia me esquecido, outra coisa muito importante que aprendi. A ser auto-crítico, não que antes eu não fosse, demais até para um brasileiro. O argentino é o primeiro a criticar a argentina, em compensação no "brasil" cada vez que mesmo que merecida lhe fazia uma critica era alvo de ataques raivosos. Sempre afirmavam coisa como: Ah, você não é brasileiro. Ou: "como você vai dizer isso? O "brasil" é maravilhoso!!". Eu sempre perguntava: Maravilhoso pra quem, e era quase linchado.

Após ter espetáculos teatrais boicotados y censurados por órgãos governamentais de Santa Catarina, entre outras coisas mínimas que no cumulativo me saturaram. Não só devido a isso como muito mais e por minha própria segurança, falta de dinheiro para fazer lobotomia e uma certa inadequação com o conformismo nato-brasilês decidi fazer meu exílio sócio-político-cultural na Argentina.

Toda semana eu escrevo sobre TV no "brasil" a um ano e algo fixamente para alguns sites, um jornal de Florianópolis e outras mídias, pois me dediquei ao jornalismo após ser expelido da carreira teatral por circunstancias externas mais que internas. E nas ultimas semanas tenho recebido balaços de vários tipos e origens, tanto que hoje resolvi falar de mim. Assim quem sabe dou mais argumentos aos meus arqui-inimigos, também não gostava do cantor recém falecido além de estar saturadíssimo de ler e escutar ainda sobre isso. ( Risos ) Era falta de assunto mesmo, oxalá que consiga voltar a temática na próxima semana, ou que passe algo de interessante na TV tupiniquins... É preciso comer e pagar as contas já que não tenho um contrato de 3 milhões por mês como Gugu, agora confirmado Record ( como já tinha adiantado a tempo), nem os 600mil da Eliana, agora SBT, etc, etc, etc...

Acrescento esta frase porque me pareceu um tanto chato terminar um texto que apesar de não dizer nada ( essa frase é uma outra arma aos insurgentes e insatisfeitos com minha existência no mundo ), diz tudo. A qüestão é: Alguém têm interesse em se conscientizar de algo?

Nenhum comentário: