quinta-feira, fevereiro 19, 2015

Ninguém quer ver a mangueira entrar?

Nando Schweitzer - Diretor Teatral e Jornalista


A pipa do vovô não sobe mais, e apesar de... Opa! Os tempos são outros, e o viagra está no bolso dos vovôs. Mas isto não é a única mudança nos carnavais dos últimos tempos. Cada vez mais é senso comum que o tradicional Bloco de Sujos, e seus homens vestidos de mulher se proliferam, até mesmo nas cidades mais conservadoras.

Por incrível que pareça para a vovó e o vovô a cabeleira do Zezé cresceu, se maquiou e muitas vezes tem no carnaval, festa pagã incorporada pela hipócrita Igreja Católica e que propicia no imaginário popular algo como uma válvula de escape, servindo para liberar as fantasias mais ocultas de nossa podre e carcomida sociedade. 

Viemos recentemente de um período de pseudo-politização da sociedade. E também de eleições polarizadas por partidos gêmeos-capitalistas de ex-esquerdas. Explico. No meu tempo viado era sinônimo de refinamento, bom gosto intelectual, e excelência nos gosto musicais. Viado que era viado(ou que se permitia em público transparecer sua orientação sexual) sonhava em viver em Paris, não na suja New York.

Lembro do carnaval no ginásio da cidade em que atirava serpentina nos garotos bonitos, das marchinhas, e que não precisava ver uma mulher com a bunda de fora a cada segundo. Saudosismo xô, xô, xô. Agora evoluímos, tivemos um rei de bateria na Grande Rio, homens pegando homens e mulheres se pegando na passarela no desfile da Salgueiro... Mas como se sabe... o que ocorre no Rio, fica no Rio... Ou o que ocorre no carnaval, morre no carnaval. Essa ousadia não ultrapassa da apuração, mesmo porque a nossa velha líder e reacionária TV Globo fez o que pode para esconder as cenas da "loucura" salgueirense em homenagem ao Fim do Mundo, de Paulinho Moska.

Hoje os LGBTs, tanto pelos hétero-normativos, mas muito mais por eles mesmos se nivelaram por baixo. Vi coisas nestes últimos tempos que são assustadores e inimagináveis para Cazuza e afins. Sapas, viados, travestis e todos os outros seres que não fazem parte das pesquisas oficiais do IBGE, votando na direita, em conservadores e em evangélicos. Ufa... Estava entalado na garganta, e não era uma pica gigante.

Amigos me insuflaram a participar da festa popular do Brasil. Justo no dia em que na cidade é tradição homens vestirem-se de mulheres. Retruquei de imediato que jamais participaria disto. Ademais, "se um dia fora presidente proibiria carnaval e futebol, para que as pessoas deixassem de perder tempo com imbecilidades e com estes dois ópios, anestésicos do povo". 

Foto da internauta: Adriana Rosa de Souza
Mas tranquilos inquietos leitores. Como esta é minha coluna de estreia no Cata o Babado e agora reproduzida aqui no Sincerando, irei pegar leve. Mesmo porque pesado neste país é apenas o ceticismo e a homofobia. Pois aproveito a grande oportunidade de nesta quarta-feira de cinzas comemorar, a diminuição dos crimes homófobos, ao menos por um dia, ou alguns nas cidades onde os festejos carnavalescos tem maior duração. Visto que "héteros" estarão travestidos nestes dias "alegres" e não querem correr o risco de matar a um "semelhante", um do seu grupo ariano-sócio-cultural-superior-hétero-normativo-neoliberal.

Festejemos, muito, mas muito mesmo... Pois a partir desta data até o próximo feriadão do "tudo é permitido" você correrá risco de vida e preconceito no trabalho, na rua, na chuva e na fazenda. Mas caso sejas uma pessoa rica, poderá se refugiar numa casinha de sapê. 

Tenho de me recuperar moralmente e psicologicamente de que pela primeira vez em anos de carnaval em Florianópolis, por não haver ido sequer ao tão famoso desfile do Pop Gay. Primeiro que gay para mim ainda é sinônimo de alegre, deturpação americanista do norte de um termo francês medieval que significa fresco ou novo. E todavia não vejo nenhum motivo para homossexuais serem alegres neste país. Também acreditava que mesmo o nome sendo um desfavor aos LGBTs, até outrora era a única ocasião em que a cidade deixava-se por algumas horas o preconceito homófobo de lado. Portanto respirava fundo, e então tragava os preconceitos poucos meus e encarava a aventura em meio a marginália e os poucos simpatizantes. 

Mas a alguns anos, ao que se extinguiram os outros pontos de bailes públicos da cidade, os frequentadores do POP GAY se tornaram muito mais hostis e ano possado prometi nunca mais frequentar o evento, ao qual fui semi-obrigado a ir para acompanhar meu grande amigo peruano, e relembrar nossas bombásticas saídas por Buenos Aires, quando feliz fui sem saber ao estudar jornalismo na ainda não hiper-inflacionada capital argentina. 

PS Babadeira: Um comentário do Facebook me chamou a atenção. Dizia: Hoje nesta balada está fácil saber quem é hétero, porque todos estão usando saias. Anedota a parte, falarei sobre as baladas Mix Friendly na próximo coluna. Um beijo, um abraço e se for bonitinho um apertão embaixo. 




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