terça-feira, abril 15, 2014

Hoje eu quero vestir você!

Fernando Schweitzer - Diretor Teatral e Jornalista


Há quanto tempo não sentes realmente a sua respiração embargada e aferida por uma atmosfera vibrantemente positiva? Quem nunca cheirou o moletom do seu grande amor as escondidas? Hoje Eu Quero Voltar Sozinho é o tipo de filme que eu lamento profundamente por não tê-lo escrito eu.

Conheci o curta que baseou a história quando vivia em Buenos Aires. Passei a todos amigos com cérebro e 
bom gosto que pude o link no Youtube. Vibrei com a notícia de Que "Yo no Quiero Volver Solito", título em espanhol para o curta "Eu não quero Voltar Sozinho", se tornaria um longa graças ao estouro do curta nas redes e mídias cibernéticas.

A ansiedade dos fãs nas redes pela estreia do longa premiado em Berlim fora me contaminando. Pensei que por ser independente o filme não chegaria as salas de Florianópolis. Tinha razão. Só chegou a uma, do outro lado da cidade. 

Justo no Shopping Iguatemi, o mais snobe, mas que por estar em um âmbito entre 2 universidades se faz de cult. Bem, lá fui. Em plena segunda-feira, dia de cinemas vazios, pois prefiro ver e escutar o filme que as pessoas sem educação e bons modos, inaptas para a via social.

Escrevi estes três parágrafos somente para deixar curiosas as pessoas.

Fiz o ritual para sentir-me público leigo. Combo médio, 50% coca, 50% fanta, 50% pipoca doce, 50% pipoca salgada, e aí pisei na sala 7. Alguns trailers e por fim pude depois de anos ter novamente em minha vida um momento de plenitude e emoção for dos palcos, como espectador. Desde que assisti Amores Imaginários, do canadense Xavier Dolan, que não tinha deixado de pensar na morte durante um filme.

O poder aplastante do roteiro, guiado delicadamente e sem exageros ou excessos de ego do diretor é impressionante. Os mesmos atores do curta de anos atrás estavam mais intensos e naturais em seus papéis, e mesmo os atores coadjuvantes não comprometeram. Guilherme Lobo principalmente, evoluiu muito, e sua personagem se tornou complexo e terno.



Nunca aprender a andar de bicicleta... Nunca ver um eclipse lunar... Nunca dar o primeiro beijo... Nunca... Nunca colocar-se no lugar de outra pessoa se tornou tão real e verossímil através de uma obra de arte. 

Detesto melodrama, e por fim tive o prazer de degustar de um filme universal embora sua trama esteja focada em um universo particular. Sempre que vejo filmes sobre histórias homoafetivas, já digo: "Lá vem mais um final trágico!". Como se na nossa sociedade o homossexual estivesse fadado ao gueto, a dor, a perseguição e ao fim épico infeliz de uma pre-destinação ao fracasso de sua via pessoal afetiva, e social.

Hoje Eu Quero Voltar Sozinho é um filme brasileiro? Não. Só por que fora dirigido por um brasileiro? Produzido e roteirizado por um brasileiro? Daniel Ribeiro conta com a produção da Lacuna Filmes e com a distribuição no Brasil da Vitrine Filmes e distribuição internacional pela Films Boutique. O longa-metragem estrelado por Tess Amorim(Gi), Ghilherme Lobo(Léo) e Fábio Audi(Gabriel) realmente é uma mudança e paradigmas para o novo cinema latino-americano.

Quando pensamos em cinema latino, logo despontam os argentinos com seus prêmios Óscar. Mas esse cinema pasteurizado a moda hollywoodiana em idiomas latino lançada por Almodóvar décadas atrás é ultrajante e ultrapassada. Temos hoje uma nova era tecnológica, novos impulsos sociais. E oremos que uma nova forma de ver o mundo que cineastas como Ribeiro, Dolan, ou até mesmo o espanhol Manuel Gómez Pereira trazem de forma contundente mas sem pragmatismos e pregações. O cinema, teatro televisão, podem ser contestadores e comoventes sem ser panfletários e engessados.

Ri. Tive os olhos úmidos. Senti o pulsar de meu coração. E voltei a resignificar o valor de poder andar de mãos dadas com alguém. Só quem assistiu ao filme poderá entender. Sai pensando: Hoje eu quero vestir seu moletom e te sentir, hoje eu quero. Mas se você não quiser vou tentar aprender a andar de bicicleta sozinho.

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