Não é confusão, é realismo! Enquanto um sindicato for presidido por um contratado de uma emissora que domina o mercado audiovisual, e o mercado teatral de várias praças... Não existirá classe artística. A luta de classes refere-se a um fenômeno social de tensão ou antagonismo que existe entre pessoas de diferentes classes sociais devido aos competitivos interesses sócio-econômicos e desejos dessas pessoas diante da lógica do modo de produção capitalista, esta que cada vez mais se aplica no âmbito artístico, dando forma a um conflito que se expressa nos campos econômico, ideológico e político.
Existem artistas que são muito otimistas, como o gaúcho Vinícius Meneguzi: "Eu trabalho nesse mercado desde 2005. Vi mudanças acontecerem. Vivo isso diariamente em elaboração de projetos e na pele lá com minha companhia e outros demais trabalhos." Mas existem muitas reclamações ainda no meio artístico brasileiro, que vão de cartelização das pautas nos teatros públicos, Lei Roaunet e falta de compromisso e camaradagem da classe que afirmam que a arte já está sucateada a décadas no Brasil.
Há teatros públicos mais caros que privados, que além disto cobram com e pela lentidão em responder um pedido de pauta diretamente diminuindo o lucro dos produtores que se tornam reféns do mercado de aluguel de teatros privados. "Quanto me cobra e em quantos meses se tardam a responder quanto a um pedido de pauta um Teatro do Ipê ou São Pedro; e quanto me cobram um Teatro CIA de Artes, Arena ou Nilton Filho? A diferença de tratamento é brutal... e isto ocorrem em várias cidades no Brasil." questionou um ator que preferia não se identificar.
Lutar como classe começa no ato básico de artistas se assistirem, pois muita gente que se diz das artes, não é frequentador. Uma classe para se unir, ela primeiramente precisa existir de fato. Se em uma cidade X, existirem 200 atores, e uma estreia teatral não tiver um público ao menos de 100 espectadores, a mim já parecerá que não existe uma "classe".
A realidade é muito semelhante em outras capitais como Florianópolis que possuiu hoje apenas 6 teatros de ordem público com 2 deles fechadas a meses pela prefeitura. Dirijo uma cia em Florianópolis desde 2003, já com esta tivemos apresentações em São Paulo, Curitiba, Porto Alegre, Joinville e Buenos Aires. E nunca, e jamais, nunca e jamais recebi um tostão de apoio, seja de ordem pública ou privada. Em um total de 26 espetáculos produzidos desde 2003. E sim, existem máfias no concedimento de pautas nos teatros públicos no Brasil. Este é o drama por um lado. E sim os teatros privadas por muitas vezes fazem as vezes de mecenas e do estado. Pois hoje é tão mais fácil e mais barato conseguir datas em um teatro privado, que em um público em várias cidades do país.
Complemento, para os que jamais viveram de editais não fará a menor diferença o aumento ou diminuição de verbas "para a cultura". Data vênia, se consideram "a cultura" estes pulhas mamarrachos de verbas públicas. Pois óbvio, se sitiam as datas nos principais centros culturais, assomados as verbas para produção e promoção das mesmas, acabam criando este falido discurso de que eles são a arte, a cultura, e quando os governos federal, estaduais e municipais cortam essas verbas esbravejam que estão a cortar verbas da cultura. Que cultura? A deles! Não a minha. Jamais.
Nos estados aonde atuo/atuei desde muitas décadas nunca vi grupos não vinculados aos governos receberem verbas, e sequer pautas em teatros que passam mais de metade do mês fechados... Preferem deixar um teatro fechado a gerar concorrência para seus tertulianos. Certos cartéis que vivem de editais a mais de décadas... Somados aos principais e grandes teatros públicos que só são dadas pautas a globais e gente amiga das fundações e secretarias de cultura. Este é um lado. De outro fazem uma arte sublime, segundo eles, quais chamo de subliminar. Verdadeiras obras inacessíveis a um público pobre e sem repertório, que quando vai a exibições assim, dorme, mas ao fim aplaude para não passar-se por inculto. Este processo sim monopoliza o acesso, tanto ao espectador, como aos produtores não mafiosos e que estão por de fora das corrutelas.
Contextualizando parte da tertúlia que ocorre hoje no país quanto aos méritos e deneméritos das atuais leis de incentivo a cultura, o renomado ator Wagner Moura para a Folha de São Paulo em 21/03/2017, deu seguinte declaração:
"Artistas são seres políticos. Pergunte aos gregos, a Shakespeare, a Brecht, a Ibsen, a Shaw e companhia, todos lhe dirão para não estranhar a participação de artistas na política.
A natureza da arte é política pura. Numa democracia saudável, artistas são parte fundamental de qualquer debate. No Brasil de Michel Temer, são considerados vagabundos, vendidos, hipócritas, desprezíveis ladrões da Lei Rouanet.
Diante de tamanha estupidez, fico pensando: por que esses caras têm tanto medo de artistas, a ponto de ainda precisarem desqualificá-los dessa maneira?
Faz um tempo, dei muita risada ao ver uma dessas pessoas, que se referia com agressividade a um texto meu, dizer que todo bom ator é sempre burro, pois sendo muito consciente de si próprio ele não conseguiria "entrar no personagem".
Talvez essa extraordinária tese se aplicasse bem a Ronald Reagan, rematado canastrão e deus maior da direita "let's make it great again". De minha parte, digo que algumas das pessoas mais brilhantes que conheci são artistas.
Esse medo manifestado pelo status quo já fez com que, ao longo da história, artistas fossem censurados, torturados e assassinados. Os gulags de Stálin estavam cheios de artistas; o macarthismo em Hollywood também destruiu a vida de muitos outros. A galera incomoda.
Uma apresentadora de TV fez recentemente sua própria lista de atores a serem proscritos. Usou uma frase atribuída a Kevin Spacey, possivelmente dita no contexto de seu papel de presidente dos EUA na série "House of Cards".
A frase era a seguinte: "a opinião de um artista não vale merda nenhuma". Certo. Vale a opinião de quem mesmo? Invariavelmente essas pessoas utilizam o chamado argumento "ad hominem" para desqualificar os que discordam de suas opiniões.
É a clássica falácia sofista: eu não consigo destruir o que você pensa, portanto tento destruir você pessoalmente. Um estratagema ignóbil, mas muito eficaz, de fácil impacto retórico. Mais triste ainda tem sido ver a criminalização da cultura e de seus mecanismos de fomento, cruciais para o desenvolvimento do país.
Aliás, todos os projetos sérios de Brasil partiram de uma perspectiva histórico-cultural, como os de Darcy Ribeiro, Caio Prado Jr., Sérgio Buarque de Holanda e Gilberto Freyre.
Ver o ministro da Cultura dando um ataque diante do discurso de Raduan Nassar só faz pensar que há algo mesmo de podre no castelo do conde Drácula. Mesmo acostumado a esse tipo de hostilidade, causou-me espanto saber que o ataque, na semana passada, partiu de uma peça publicitária oficial da Republica Federativa do Brasil.
Sempre estive em sintonia com a causa do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto); fiz com eles um vídeo que tentava explicitar o absurdo dessa proposta de reforma da Previdência.
O governo ficou incomodado e lançou outro vídeo, feito com dinheiro público, no qual me chama de mentiroso e diz que eu fui "contratado" -ou seja, que recebi dinheiro dos sem-teto brasileiros para dar minha opinião.
O vídeo é tão sem noção que acabou suspenso, assim como toda a campanha publicitária do governo em defesa da reforma da Previdência, pela Justiça do Rio Grande do Sul.
Um governo atacar com mentiras um artista, em propaganda oficial, é, até onde sei, inédito na história, considerando inclusive o período da ditadura militar.
Mas o melhor é o seguinte: o vídeo do presidente não conseguiu desmontar nenhum dos pontos levantados pelo MTST.
O ex-senador José Aníbal (PSDB) escreveu artigo em que me chama de fanfarrão e diz que a reforma só quer "combater privilégios". Devo entender, então, que o senhor e demais políticos serão também atingidos pela reforma e abrirão mão de seus muitos privilégios em prol desse combate? E o fanfarrão ainda sou eu?
Se o governo enfrentasse a sonegação das empresas, as isenções tributárias descabidas e não fosse vassalo dos credores da dívida pública, poderíamos discutir melhor o que alardeiam como rombo da Previdência.
Mas eles não querem discutir nada, nem mesmo as mudanças demográficas, um debate válido. O governo quer é votar logo a reforma, acalmar os credores, passar a conta para o trabalhador e partir para a reforma trabalhista antes que o povo se dê conta.
Tenho uma má notícia: no último dia 15, havia mais de um milhão de pessoas nas ruas do país. Parece que não é só dos artistas que eles deverão ter medo."
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