Mas e o Óscar? Enquanto artistas burgueses do grande circulo do entretenimento gargalham em festas luxuosas mundo a fora, nós os da base piramidal da cultura, nem pão conseguimos em troca da nossa arte.
Ela, a arte, olhou para as próprias mãos. Estavam cansadas, como se a pele ainda guardasse as cicatrizes invisíveis de outras mãos que um dia serviram, forçadas. De onde vinha esse cansaço, essa dívida histórica que nunca parecia se pagar? O aluguel, a comida, a água, a energia. O corpo que se levanta antes do sol e se recolhe depois da lua. A pele escura ou pálida, mas sempre subjugada. O tempo do descanso que nunca chega, o sonho sempre adiado.
E o Óscar, gente, é do Brasil!!! Acho que a casta inferior não é o Brasil. Pois, dadas as circunstâncias da realidade da produção cultural no país e em geral no mundo capitalista seja de primeiro ou quarto mundo é a mesma! Obsoleta, ingerível, destruidora de sonhos e palatalmente dura de tragar, como uma mescla de Campari e vinho velho seco de marca duvidosa.
A liberdade chegou em papéis assinados, mas não nos dias que se repetem em uma escala 6x1. Seis dias de entrega, um dia para respirar — ou tentar lembrar como se respira. Como se fosse um presente. Como se o corpo não precisasse de mais. Como se a mente não soubesse que a engrenagem gira e gira e gira e não há saída.
Na escravidão, os corpos eram vendidos; agora, alugam-se. O preço? O que for suficiente para sobreviver — mas nunca para viver.
Quem paga isso? E mais: quem decide o que vale um dia, um mês, uma vida?
Ela fechou os olhos por um momento, tentando lembrar de um tempo em que não houvesse contas a pagar. Mas a memória falhou, porque nunca houve. Sempre foi assim. E talvez continue sendo.
Mas, por um instante, a revolta cresceu silenciosa dentro dela, como uma faísca no escuro. E pensou: talvez seja tempo de mudar a pergunta. Talvez a resposta não esteja nas contas, mas na coragem de quebrar esse ciclo que insiste em se repetir.
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