Fernando Schweitzer, Florianópolis-SC - Ator Não-Global, Diretor Teatral, Cantor, Escritor e Jornalista
"A liberdade da mídia não se mede pelo que se pode dizer, mas pelo que se ousa mudar." Muito se falou e muito mais se falará sobre política, mídia e futebol. Três pilares da discussão social que, em tempos de polarização extrema, assumem contornos ainda mais radicais. O mundo de 2025 se vê novamente imerso no retorno da ultradireita, reconfigurando narrativas e redefinindo as prioridades do entretenimento e da informação.
A TV, como reflexo da sociedade, espelha essas mudanças e, em alguns casos, reforça suas estruturas. No Brasil, onde a tradicional dominação das grandes emissoras sempre ditou o consumo midiático, a rigidez dos formatos e a busca incessante por status continuam sendo elementos centrais na cultura televisiva. Mas até que ponto esse modelo ainda se sustenta?
O Paradigma da TV Aberta: Brasil x Argentina
Ao visitar Buenos Aires, é impossível não notar um ecossistema televisivo distinto do brasileiro. A líder argentina, Telefe, embora ocupando um papel dominante, apresenta uma dinâmica diferente: a busca pelo conteúdo acima do status. Um exemplo clássico é o programa CQC, originado na produtora independente Cuatro Cabezas e transmitido por diferentes canais no mundo ao longo dos anos e em seu país nativo mudou de emissora algumas vezes.
No Brasil, essa mobilidade televisiva é rara. Programas como "Ídolos" apenas migraram de emissora devido a questões contratuais internacionais. Fora isso, formatos se mantêm estagnados e, mesmo quando perdem seu elenco principal, persistem como marcas imutáveis. Isso cria uma estrutura de dependência de grandes redes, fazendo com que a qualidade seja frequentemente subordinada à reputação de seus astros e não ao potencial criativo.
A Nova Ordem Midiática e o Avanço da Ultradireita
Com o renascimento da ultradireita ao redor do mundo, incluindo o Brasil, a comunicação passa a ser instrumentalizada de forma ainda mais incisiva. O discurso de que apenas "uma verdade oficial" deve prevalecer cresce, minando espaços de experimentação cultural e consolidando um oligopólio ideológico na mídia.
A Argentina, apesar de também enfrentar ondas conservadoras, mantém sua tradição de valorização do conteúdo acima da estrela. Um exemplo emblemático foi a trajetória de Cris Morena, criadora de êxitos como Chiquititas e Floricienta, que não hesitou em levar suas produções de um canal a outro, sem perder relevância. Enquanto isso, no Brasil, um programa como Casseta & Planeta jamais conseguiría existir fora do guarda-chuva de uma gigante como a Globo.
A Massificação e o Engessamento Criativo
A TV brasileira, ancorada na segurança de sua bolha tradicional, perpetua um discurso homogêneo e robotizado. Os formatos são reciclados, os talentos são os mesmos e as apostas continuam seguras. Em um mundo onde a mídia digital pulverizou o monopólio da audiência, insistir em um modelo fechado parece, no mínimo, anacrônico.
Se Garrincha, por fugir do padrão comportamental da sociedade conservadora, nunca foi considerado o verdadeiro rei do futebol, podemos dizer que a suposta qualidade da TV brasileira é uma ilustração perfeita de como a massificação impõe limites criativos.
A verdade é que a TV argentina prova que o conteúdo sobrevive sem um rótulo fixo. E se no Brasil a insistência na imutabilidade de formatos perdurânticos, talvez seja a hora de nos perguntarmos: a grama do vizinho continua mais verde? Ou apenas nos recusamos a olhar para o próprio quintal?
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